Quando fiz a tal promessa de postar apenas sobre Copa nesse período, não devo ter me recordado que o dia 25 de junho iria cair durante a Copa do Mundo. É neste dia que o mundo perdeu um dos maiores gênios de sua música. O blog preparou uma homenagem que reconta alguns dos passos da carreira desde astro, uma longa, mas reveladora reportagem. Não vamos celebrar uma data onde não há nada a ser comemorado e sim relembrar os principais momentos da carreira daquele que mudou o mundo das artes. Vale a pena favoritar e conferir na íntegra.
No início da década de 80, momento de explosão de Jackson, nem nos confins do planeta se encontraria um adolescente que não tivesse se arriscado a imitar o quase impossível moonwalk, a dança que ele inventou ao fundir a suavidade dos passos de Fred Astaire à agressividade dos dançarinos de break, ou suas coreografias sensacionais, profundamente estilizadas – como aquela mão na virilha que era, ao mesmo tempo, erótica e uma paródia do erotismo. Hoje, não se encontra em lugar nenhum artista pop que não dance no palco à maneira de Jackson: como uma declaração criativa que avança por territórios e sentidos aos quais a letra e a melodia não chegam. Mas essa foi apenas uma das revoluções de Jackson.
As imagens de Thriller, catorze minutos que sempre pareciam curtos demais, cravaram o videoclipe como a forma essencial de veicular uma música e ajudaram a tornar a MTV uma força decisiva entre o público jovem. E o público jovem (com a ajuda decisiva de Walter Yetnikoff, então presidente da CBS, que ameaçou tirar todos os artistas da companhia da MTV caso ela não exibisse Thriller) obrigou a emissora, que antes torcia o nariz para artistas de música negra, a abrir sua programação para eles. Hoje, o rap e o rhythm’n’blues (R&B) são os estilos hegemônicos na emissora.
Jackson desenhou ainda o mapa de comportamento do ícone pop para as décadas seguintes: o artista inacessível que, com suas esquisitices e demandas, causa frenesi entre os paparazzi, aumenta a circulação dos tabloides e leva seus assessores e contratantes à loucura. Pop star que se preze, hoje – e a lista vai de astros normais como Madonna, Justin Timberlake e Mary J. Blige a excêntricos do quilate de Mariah Carey e Britney Spears –, reza pela cartilha escrita por Jackson. Em uma reflexão que só pode ser feita a posteriori, Jackson foi ainda um exemplo definitivo do soft power, ou a tração que um país exerce por meio de conceitos e ideias. Na primeira parte da década de 80, a economia americana estava às voltas com um dado novo e desconcertante: a ascensão esmagadora do Japão como potência industrial – e dono de uma indústria não mais imitadora, como antes, mas criadora. A Sony japonesa lançou, nesse período, um ícone cultural tão poderoso quanto o próprio Thriller: o walkman, acessório que inaugurou a era da portabilidade da música. Mas os Estados Unidos, se não inventaram o aparelho, tinham a música que se ouvia nele – a de Michael Jackson.
Ele de fato criou o pop. Até a década de 70, a música jovem se dividia em dois nichos distintos. Havia o rock e suas variações, consumidos principalmente por adolescentes brancos e de classe média. E havia a música negra – soul, funk, disco, rhythm’n’blues –, que era ouvida por negros. Jackson quebrou essa barreira em discos como Off the Wall, de 1979, e Thriller, de 1982, e borrou para sempre a linha que separava os dois universos. Nesses discos, o cantor talhou as linhas de baixo e bateria na medida para as pistas de dança; mas associou-as à vibração característica do rock’n’roll. Até mesmo as origens de um fenômeno social notável entre os jovens americanos, o dos adolescentes brancos que querem falar, dançar e agir como negros, podem ser traçadas diretamente à sua influência.
Descontado Stevie Wonder, que lançou o primeiro disco aos 12 anos, mas cujo apelo nunca residiu no magnetismo ou na dança, Michael Jackson foi o primeiro grande ídolo mirim da música. Nascido em 29 de agosto de 1958 em Gary, no estado de Indiana, desde cedo ele mostrou talento para o canto e a dança. Seu pai, Joseph, que havia tentado a carreira num grupo de rhythm’n’blues, percebeu logo o talento de Michael, bem como de seus outros filhos. Transformou-os no Jackson Five, que ensaiava exaustivamente. Em 1968, o grupo foi contratado pela gravadora Motown, a referência mítica da música negra. A audição do Jackson Five para Berry Gordy Jr., fundador e presidente da Motown, deixa claro que a estrela ali era Michael. No vídeo remanescente do teste, ele canta I Got the Feelin’, de James Brown, e encarna todos os trejeitos do astro do funk – mas com graça própria.
Ao se lançar como artista-solo, em 1971, Jackson já havia aprendido muito sobre composição e produção musical. Teve a sagacidade de, pouco depois, aliar-se ao produtor Quincy Jones, que havia feito carreira no mundo do jazz. Eles colaboraram nos álbuns Off the Wall, Thriller e Bad. Jackson não era ainda o recluso das últimas décadas, mas um artista curioso e vivo. Muitos dos ritmos presentes nesses trabalhos nasceram de suas idas às discotecas, e suas letras vinham repletas das angústias de um rapaz da sua idade. Até 1996, ano em que foi ao Morro Dona Marta, no Rio de Janeiro, e ao Pelourinho, em Salvador, para gravar o clipe de They Don’t Care about Us, Jackson ainda vivia no mundo real. Cada vez mais, porém, ia sendo dominado pelo lado obscuramente infantilizado de sua personalidade, que o levaria, a certa altura, a se isolar em sua bizarra propriedade de Neverland – ou Terra do Nunca, em referência ao lugar em que vivia Peter Pan, o garoto que não queria crescer. Esse Jackson aberrante e patético encobriu o totem da revolução pop. Mas, com a sua morte, ele renasceu.
Certa vez, Michael afirmou que uma das metas de sua vida foi conquistar a imortalidade pela música. Não há dúvida de que conseguiu. Não só sua música. Há um pouco – ou muito – de Michael Jackson no canto e na dança de Justin Timberlake, Usher, Chris Brown, Rihanna... e até Prince, Madonna ou Black Eyed Peas. Antes de Michael Jackson, havia nichos sonoros para públicos específicos: o rock, o soul, a salsa. Depois de Michael Jackson, há... qualquer coisa que você vai ouvir, no universo do pop, nos próximos 20 anos.
Neverland, 1 ano depois de morte de Michael
Após morte, aumenta o faturamento
Quando morreu, em 25 de junho de 2009, Michael Jackson era um rei endividado - é notório que o dinheiro era a principal motivação do astro para voltar à cena, o que ele faria no show This is it - em fase de ensaio à época da morte.
Um ano depois, a situação financeira do espólio de Michael Jackson é outra. Segundo estimativas da Billboard, que procurou a indústria da música, da TV e do cinema para fazer as contas, o astro arrecadou notáveis 1 bilhão de dólares (cerca de 1,773 bilhão de reais), da data da morte até hoje.
Desde junho, o astro vendeu cerca de 9 milhões de discos nos Estados Unidos. Fora desse país, as vendas bateram os 24 milhões no ano passado. O preço médio de cada CD é de 12 dólares - o que lhe rendeu, no total, algo como 383 milhões de dólares. Somando a isso as vendas de faixas digitais, os toques de celular e outros produtos do tipo, a Billboard chegou ao número de 429 milhões de dólares - somente para comercialização de música.
Depois das músicas, Michael Jackson: This is It, o documentário sobre o ensaio do show que nunca houve, lançado em 28 de outubro de 2009, é o segundo colocado no ranking de arrecadações. Ao todo, ele trouxe ao espólio 392 milhões de dólares.
A conta é minuciosa e prevê, por exemplo, a valorização de bens existentes e até lançamentos futuros. A Mijac, gestora dos direitos autorais do catálogo do cantor, valia 75 milhões de dólares em 2005. Hoje, pode ser vendida por 150 milhões. O contrato de lançamento de álbuns, pela Sony Music Entertainment, até 2017, deve garantir ganhos de algo entre 200 e 250 milhões de dólares.
O valor mais interessante, porém, não é o maior. Cerca de 6,5 milhões de dólares dizem respeito aos milhares de ingressos da turnê This is It. Em vez de reclamarem o reembolso, um direito garantido pela organização do show, muitos dos fãs preferiram guardar o tíquete como lembrança. Ponto para o espólio.
Com informações de Veja, Contigo e Época